Mandonismo

Francisco Celso Calmon

A contradição que o PT local está vivendo não é um fenômeno isolado. É o mesmo que a sociedade brasileira vive, talvez ainda de forma latente, não totalmente manifesta e lúcida. Trata-se de qual democracia o povo brasileiro quer para o seu país, igualmente qual a democracia que a militância petista quer para o seu partido?

Queremos construir uma democracia dos cidadãos ou uma "democracia" das elites? O poder de uns poucos, que se julgam os melhores - aristocracia - ou o poder do povo, que são muitos? É a República dos amigos, do corporativismo, do patrimonialismo, das instituições corrompidas? É a república oca, tal qual uma igreja sem fiéis? É a república sem povo, mas em seu nome governada? O Brasil das oligarquias, dos Sarneys, dos ACMs, dos RenanCollors..., mutáveis nas pessoas, mas permanente na estrutura de domínio do poder?

É a democracia de pés de barro - frágeis na essência, cínica e hipócrita na aparência? Ou desejamos construir uma República de todos e administrada de forma democrática, na qual, sempre que viável é o povo que diretamente decide, e cuja postura seja a decência, a transparência e a participação coletiva solidária?

O que objetivamos para o macrocosmo social, também devemos construir no microcosmo partidário. Se os partidos, sujeitos dessa construção, não praticam internamente o que dizem querer para a sociedade brasileira, como serão capazes? Se não praticam a democracia interna, como seus quadros se comportarão quando no poder? Para que serve a militância? Para fazer o teatro do faz-de-conta, para sair na fotografia, para levantar e baixar crachás e bandeiras?

Eis porque combatemos o que chamamos de geopolítica de gabinete. Ela é uma metodologia de apartação. Aliena o povo, exclui a militância. O Espírito Santo esteve entregue institucionalmente ao crime organizado, foi necessário um movimento de muitos, e que contou com lideranças à frente, não de uma, de algumas, mas que tinham muitos atrás. Entretanto, à guisa de que o crime organizado ainda está incrustado, apregoam que o caminho vitorioso é aquele que tem um chefe acima de tudo, que só o que vem dele assegura a trilha do bem. É o mandonismo, grave acinte à democracia.

O PT-ES já cometeu seus erros, desgastou-se, retraiu-se, revigorou-se. É hoje a legenda com maior apoio eleitoral. Quando tinha tudo para ser vanguarda, tornou-se caudatário da estratégia hartunguista. Estranha e, ainda, inexplicavelmente, seu quadro de maior popularidade, João Coser, com uma postura de dono do partido, explicitando informações incompletas, provocando a indisciplina no interior do PT, acirrando prematuramente divisões, hipertrofiando a democracia interna, assumiu a articulação do candidato ungido pelo governador, antes do partido arquitetar, democraticamente (isto é: através do contraditório) a sua tática eleitoral.

E é até pitoresco saber que o candidato Ricardo Ferraço "tem convicção absoluta de garantir um palanque a Dilma". O candidato tem forte rejeição na militância de esquerda, não se sobressai como um excepcional gerente, por que, então, é o ungido?

Ajudar a Dilma é em primeiro lugar manter o PT disciplinado e unido. Por tudo, a indagação que ferve no meio político é o porquê do Coser ter cometido erros tão primários, sendo o político que é?

Francisco Celso Calmon Ferreira da Silva é fundador do PT.


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